terça-feira, 21 de agosto de 2012

Na cama

Rio de Janeiro
Santa Tereza

Ocupação horizontal
Que beleza

  É preciso cama, e com amor 

ÔPS!!!!
Não é nada disso.
Juro por Deus que não vou falar das maravilhas do amor carnal, juro mesmo, vou não.

Bem,  vou é falar de repousar.  É, verbo em desuso: coisa antiga.
Ficar de cama sarava de um tudo, que era uma beleza.
Gripe?  Vitamina C e cama.
Fraturas?  Gesso, gesso mesmo, brancão, dois dias para secar, pé para cima, e cama. Nada de botas Robocop para circular por aí, não.
Criança levada?  Dois tapas no bumbum, e pode chorar na cama que é lugar quente.
Males do fígado, do rim? Mulher parida?  Canja de galinha e cama limpa.
Pneumonia? Cama, mas muda de posição senão piora.

Hoje não. Hoje tem a tal da reação. Engole um comprimido sei lá de quê e reage. Vai a luta.
Calma -  tudo tem seu tempo. O corpo e sua cura também. Repousar é um exercício de paciência, de pacifismo. Lutar pacificamente pela recuperação de si mesmo. Evolução espiritual, caríssimos, evolução.
Pobre de mim, impaciente e afoita,  primitiva criatura taurina. Gulosa, andei abusando dos frios. Parma, salaminhos, e outros presuntinhos. Um gorgonzola aqui, outro ali... Só, mais um pouquinho, amor, vai.
Embolou. A coisa pesou, a coisa ficou esquisita. Que fez meu amor? Homem sábio que é, colocou-me na cama. De molho. De repouso. Ficou ali, ao meu lado, dia e noite, paciência sem fim. E eu sou chata, hein. Reclamo, resmungo, o travesseiro está duro, está frio, está calor, está apertado, cadê você, vem para cá, vai para lá, ajeita assim, o som está alto, o som está baixo, tenho sede, não quero água, ai maldito salaminho.

Confesso - o estado de repouso nos fragiliza. Somos fortes por imposição desta maluquice de mundo, que contraria nossa essência humana o tempo inteiro, ou há quem imagine que nascemos para matar um leão, assim, todo dia?  Claro que não!!!! Doentes, acamados, voltamos a ser os filhotes que precisam de cuidado o tempo todo.  A realidade é essa: não somos fortes. Não somos independentes. Em algum momento, precisamos ser olhados, cuidados, amamentados. Remédio na boca, água na boca, cobertas arrumadas, lençóis trocados. Acordamos vinte vezes, inquietos, incomodados, assustados, e precisamos vermo-nos acompanhados, ali, juntinho ao nosso corpo enfermo o corpo do amado.  Precisamos ser bem queridos, sim, muito bem queridos, porque tem que ser com amor, zelo com amor,  senão não vale de nada; senão é coisa de enfermeira alemã.  Senão magoa, e mágoa é doença danada que não cura fácil não.  Mágoa é mais difícil, carece de outros tratamentos.

A valentona aqui virou criança boba. Bebê indefeso.  Grandalhona, desinibida, qual o quê.  Fiquei pequena, arriada, encolhida.
Na cama, inocente. Mão estendida para te alcançar,  para segurar em você. Medo de afundar, de piorar, de   agravar.
Febre veio e passou. Enjôo veio e passou. Dor corpo afora, veio, parecia que ia doer mais, mas passou.
Salaminho, nunca mais. Amor, sempre.  Para sempre. De mãos dadas comigo, abraçado comigo. De repouso comigo.  Sorrindo para mim, a postos para mim. Pronto para mim. Aguardando, pacientemente, pela minha melhora.

E ficamos assim, que amor cura, e paciência cura. Ficamos na horizontal, parados, imóveis. Permanecemos deitados através do tempo,  incomum e necessariamente imóveis.

Repousar junto é prova de amor. E afinal, quantas mil maneiras, enfim, temos de ocupar esta cama?






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