segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Um homem para chamar de seu

É
Parque Lage
Para lá se vai
Espantar a Solidáo

Foto: Anna Schnneider, da série Domingueiras da Primavera

Caríssimos, não sei quem é a moça da foto, e espero que ela náo se ofenda. Deve ter nome, endereço, identidade, profissáo, claro, mas nesta foto e neste blog ela náo tem um nome. Tem muitos, de muitas e muitas brasileiras. Lista longa.

O olho mágico da fantástica Ana, em suas aventuras dominicais, registrou seu breve enlace com o homem de ferro. De metal, homem sem sangue e sem coraçao, uma mera forma masculina sem alma, tal qual congêneres disponíveis no mercado. Um segundo olhar descreve melhor nossa protagonista desta cena rotineira: é uma pessoa de um certo trato, no mínimo. Cabelos brilhantes, pele alva, vestido longo (está na moda), pés claros em sandálias aparentemente novas.

Um terceiro olhar assusta. Ela está encostada, com a displiscência dos que sentem-se muito bem e à vontade, em um homem que náo tem vida. Aprochegada, como dizem por aí. Cena de um casal em manhã de domingo, aquela horinha morna ainda preguiçosa em que um lê jornal, o outro comenta. Depois trocam de cadernos, conversam, minutos passando aos poucos, váo aproveitando que náo tem hora, nem criança, nem mercado, nem banco, nem trânsito,nem chateaçáo. Só que neste domingo, e neste banco, a moça é real e o homem náo.

A moça é de carne e osso, e o homem náo.

O homem aí da foto, náo tem vida. Náo se apercebe dela. Vantagem, pois indiferente que é, não reclama que ela encostou no ombro doído, nem que está com calor, e nem que ela está amassando o jornal. Nem que ela náo esteja dando-lhe sua táo merecida atenção. E mais, meio que oferece o jornal para que leia. Vejam, ele está discretíssimamente inclinado em sua direçao. Ela entáo continua, feliz, no mesmo banco, ao lado deste homem calado. Homem fake. Homem que náo existe para ninguém, a náo ser para ela e para o departamento de parques e jardins de nosso município.

A estátua é fria, inerte, inútil, mas serviu para iludí-la. Náo há, neste aspecto, tanta diferença para os demais representantes (animados) do gênero. A maioria deles, inclusive, estaria dormindo neste horário, pois a primeira criatura a quem deve satisfazer, é sem dúvida, Elezinho mesmo. E você, caríssima, tinha a ilusão de que seu namorado faria-lhe companhia.

Há outras moças solitárias no domingo. Incompreendidas fêmeas, que nessa manhã, e em várias outras, adorariam ter um representante do sexo oposto, vivo, inteligente, e interessante, que náo reclamasse ou impusesse condições para breves momentos de paz. Que deixasse o domingo passar sem muito esforço, assim, como quem lê um jornal em boa companhia.

Os próximos capítulos seriam especulações dessas suas colegas, as formandas da Escola Solidáo. Sós, e mui perspicazes senhoras. Afirmam, com a propriedade dos observadores: independente de todo o resto, a moça da foto, no banco da praça, no domingo de primavera, no Parque Lage, numa linda manhá de sol, ah, ela tinha um homem para chamar de seu.

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