sábado, 29 de outubro de 2011

Noel, feitiço bonito da Vila Isabel

Rio

Leblon

- Cafë, madame?
- Sim,Café Pequeno

NOEL - FEITIÇO DA VILA de Andreia Fernandes.
Cia de Theatro Musical Brazileiro. Dir. Édio Nunes e Jorge Luis Cardoso. Dir. Musical Wladimir Pinheiro. Teatro Café Pequeno.


O apito da fábrica de tecidos me chamou. Fui, assim, meio fugida do dia, meio apressada da noite, e entrei.

O palco é pequeno, mas o talento é grande. A Cia de Theatro Musical Brazileiro está aí para provar: nada substitui o talento, já foi dito e aqui repito. Pouco espaço e muito talento tornam o espaço suficiente – um varal é cenário, um lenço é figurino. Um violão, bem um violão é um universo na máo deste elenco.

Encontrei Noel, encontrei Aracy, encontrei Patricia Costa, esbarrei em Cartola e Ismael Silva. E aí, caríssimos, náo encontrei mais ninguém. Perdi-me na boêmia da Vila Isabel de um tempo bonito.

A história deste gênio da notas musicais foi contado por outros, em outros palcos, e talvez com mais recursos financeiros. Não sei dizer se com tanto capricho. Capricho de malandro, que sabe que é no detalhe que se ganha a confiança. É no miudinho do samba que o mestre se mostra.

Com mais foco na música que na dramaturgia, o espetáculo passa como a Vila Isabel na avenida: belo aos olhos, aos ouvidos, ao coração. Lindo de se ver e de cantar, e o público assiste a um show de Noel e a uma peça sobre a sua vida pelo mesmo ingresso. Não há adereços luxuosos nem carros alegóricos fenomenais, há um varal e vê-se o Morro. Há cadeiras e garçon, e vê-se o bar. Moças enfeitadas e malandros, temos um cabaré.

A simplicidade funciona, caríssimos, e isto é fantástico. É a liberdade da expressão do artista, sua independência de orçamentos e patrocínios. Seu talento.

Pedro Arrais é um Noel irresistível, talvez o rapaz seja belo demais para o papel, afinal, Noel tinha o maxilar direito deformado pelo fórceps que o trouxe ao mundo. Em seu favor, precisamos lembrar que Noel seduziu cabrochas experimentadas, o que exige qualificações; então que seja Pedro Arrais o Noel de hoje, seduzindo com sorriso, chapéu panamá e sapato bicolor. Branco como Noel, sedutor como um malandro de gafieira. Quem viu, concorda, e como.

Francisco Alves, voz de ouro, era um explorador de iniciantes, e um canastráo de primeira. Gabriel Titan nos convence disto, e canta de verdade, com graves brilhantes de dar inveja. Vejo nele o cantor que atua, ou o ator que canta. Uma voz dessa náo pode se calar. Estamos na era dos musicais, está para ele, ponto.

E como se náo bastasse, há Patricia Costa no palco.

Atriz que vai de Aracy de Almeida a cabrocha da Mangueira; que vai de lavadeira a estrela brilhante. Aracy, reconheçamos, deve ter sido pioneira em sua macheza na roda da malandragem, e era feia de doer. Patricia esteve perfeita no papel. Cabelão sem trato, calça reta, óculos fundo de garrafa. Bicando cachaça e cuspindo no cháo. Em dois minutos sai de Aracy e volta de estrela. Irreconhecível, elegante, metaforseada, chiquérrima. Afinadíssima, suave, ela entorpece a platéia com a melodia e a poesia dO Apito da Fabrica de Tecidos, e neste momento, todas nós queríamos que a moça da fábrica, artigo que náo se imita, desse bola para Noel Rosa.

É isso. O talento da transformaçao - Aracy vira Patricia, Pedro virou Noel e Gabriel virou Francisco Alves. E o elenco todo deu seu melhor. Entre iniciantes e experientes, todos eram o povo da Vila, da Mangueira, do Morro dos Macacos em tempos de paz e samba.

Parabéns aos diretores, atores, músicos. Provaram que não precisa ter 200 pessoas no palco. Bastam 13. Basta um bom roteiro. Basta bom gosto.
Basta um Brasil, rico em artista talentosos.

Basta o ilustre Noel Rosa, que luxo.

O ótimo elenco, na cena da despedida - volte logo, Noel

Nota - meu avô, orgulhoso morador da Rua Teodoro da Silva, coração da Vila, teria curtido muito, ah, teria.

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