sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O avesso da Costura

São Paulo
Chique é ter dignidade

Uma das 1.445 lojas da Zara, cuja marca tem valor estimado em US$ 7.468 bilhões (2010), com presença global: 77 países

"O escândalo começou com a marca espanhola Zara, depois de a cadeia televisiva brasileira Band ter acompanhado uma equipe de fiscais do Ministério do Trabalho que acabou por libertar várias pessoas (a maioria das quais estrangeira) que fabricavam peças de vestuário para a empresa AHA, a quem a Zara encomenda trabalho.
Os trabalhadores-escravos tinham sido, na maioria, recrutados na Bolívia com promessas de melhores condições de vida no Brasil. Ao chegarem a São Paulo, eram obrigados a cumprir jornadas laborais de 16 horas por salários que rondavam os 240 euros por mês. Além disso, os empregadores descontavam do salário dos trabalhadores o custo da viagem até ao Brasil e a comida."
(O Globo on line
)

Bem, o assunto é duro, mas necessário. Temos contribuído para a escravidão contemporânea.

Sabe quando você vai ao Shopping Leblon, ou ao Rio Sul, e sente um cheiro de gente rica? Cuidado. Você pode estar na loja da Zara.

Lindas roupas. Tem para os ricos, ou que parecem ricos. Tem para os bem vestidos. Para os que aguardam a liquidação para vestir-se com essa griffe internacionalmente reconhecida como moderna e elegante. É preciso aqui apontar que no Brasil, o assunto moda ainda traz confusão de conceitos. Nesta Terra, a elegância está equivocadamente associada ao sucesso financeiro. Erramos feio neste quesito também - o mais humilde vendedor de cuscuz, com sua alva roupa, impecável, e chinelos de dedo, pode estar elegantérrimo.

Sigamos. Enfim, você é atraído pelo glamour da vitrine, e pensa estar em uma loja bacana.

Entra. Escolhe. As vendedoras são magras, e modernas. Cheiram a perfume francês. Você experimenta. E gosta.

A roupa cai bem, tem ótimo corte, ótimo acabamento, é diferente, e deixa o consumidor melhor do que a natureza o fez. Pode comprar. Vai resistir a lavagens e modismos. Vai valorizar as formas femininas e na linha infantil, será estilosa para os filhotes.

Você sai do shopping com aquela bolsa preta, e quatro letras ZARA indicam que você sabe comprar e tem bom gosto. ENGANO. Tudo errado. Você foi enganado. Seu dinheiro limpo alimentou o trabalho escravo, e não tínhamos nem idéia. Caríssimos, eu já fiz esse roteiro, e não dá para voltar atrás e reescrever o texto. Só deste capítulo em diante.

A Zara, como a Ecko e a Billaboing utilizam mão de obra escrava, em pleno século 21, era de declarações de direitos, constituições, votos. Estados Democráticos de Direito. Ferozes capitalistas, ignoram as teorias humanas, sociológicas e solidárias. Deletaram anos de estudos acadêmicos sobre produção racional e economia sustentável.

Enquanto desfilamos a moda ZARA, uma latino americana é humilhada, vergonhosamente. Só tem sua força de trabalho para vender, ou melhor, para entregar em troca de comida. E o pessoal de compras da Zara não se importa com a covardia da troca. Trocam com prazer.

Para sair da oficina que também era moradia, era preciso pedir autorização (Foto: Fernanda Foroni)

Que pena, mundo. Que pena que os empresários não aprenderam com o passar do tempo, com Hegel, Marx, Weber, com Mandela. Emagrecem a galinha dos ovos de ouro da economia com a exploração desumana. Empobrecendo o trabalhador a sociedade empobrece e perde poder aquisitivo. Não compra, e sem comprar, a indústria não tem para quem vender.

Independe se dez empobrecem e um compra por vinte. O mercado interno perde, e perde feio. O país perde dinheiro se temos menor número de cidadãos sem disponibilidade financeira. O dinheiro precisa circular horizontalmente para que a economia da nação se fortaleça. É preciso irrigar com capital mais e mais classes sociais, sob pena de que miséria pese ao ponto de tombar o tênue equilíbrio numérico da sociedade, fazendo com que as notinhas verdes escorram para um lado indesejado: o da marginalidade.

A Senhora Roseli Meíra, dona da marca, talvez não saiba do que passa. Mas nós sabemos. Boicotemos essas lojas. Por ética, ou por repúdio à sua estratégia fadada ao fracasso.

Ao passar por suas vitrines, viremos a cara. Nada ali nos interessa.

O vendedor de cuscuz é mais chique mesmo, em sua dignidade, que qualquer moça bonita vestida de ZARA.



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