sábado, 28 de maio de 2011

Um Violinista no Telhado

Le Blon
Le Bien
Le Bon

Toca Violino,
toca alto toca bonito

Vá, escute o violinista.
José Mayer, na musical de Moeller e Botelho


Vi o filme, de 1971, um clássico premiado. Um musical que canta e conta a vida dos judeus que habitavam a Rússia, seu cotidiano pacífico, seus costumes. Em 1905 foram expulsos de sua aldeia, casas desapropriadas, despejados. Bens arrancados. "O violista no telhado" apropriou-se do título do quadro do pintor Marc Chagall, que retratou um violinista tocando sobre um telhado, equilibradíssimo sobre o vértice das telhas, enlevado pelo som precioso e inebriante de seu instrumento. Símbolo e representaçao deste povo, que mantém suas qualidades afinadas, típicas, em situações insustentáveis. Suas tradições, seus rituais de uniáo, de amor à família, à raça, ao sangue. A história é supostamente fictícia, mas inspirada em histórias reais.

Os judeus foram perseguidos cruelmente atráves dos séculos. Os católicos inventaram que eles mataram Cristo, mas quem matou Cristo foram os romanos. Os alemães queriam seu ouro, seu dinheiro, os árabes suas terras. O mundo, sua inteligência.
Atravessam a ordem cronológica da história brigando por sua terra, por sua identidade, por sua honra. Defendem-se com unhas e dentes, e muito trabalho e união. Vencem no que se propuserem a realizar: ciências, arte, economia.
Não se conformam com menos que o sucessso. Só o sucesso os protegerá dos loucos.

Orgulho-me. O sobrenome de minha avó materna, de origem portuguesa, era "de Carvalho". Isso significa que ela descendia de judeus que imigraram, nos idos de 1400, para a Península Ibérica, a fim de sobreviverem a mais uma perseguição. Adotaram sobrenomes de árvores para que náo fossem identificados e assassinados. Se comprovado, seria para mim uma honra imensa, que eu carregaria como um colar de diamantes, a marcar minha estrela no peito.
Amo os sobreviventes. Amo os vitoriosos, assim, de vitórias merecidas.

É assistir ao espetáculo e concordar: a história desse povo é linda. É rica, é espiritual. São amorosíssimos entre si, é o amor da alma judia, móvel sobre a Terra, e imutável em sua essência. À essa época demonstravam frieza no trato com os estranhos ao seu povo, por defesa, por medo, por precaução. Os católicos russos eram seus predadores.

José Mayer náo é judeu, mas devia. Nasceu para esse papel. Esqueça o pegador da Globo. Aqui temos uma ator de primeira linha. Ofusca Soraya Ravenle, que precisaria de mais espaço, de mais músicas para soltar sua voz. Mayer é irônico, leve, agradável, canta muito bem e com espontaneidade. Passar três horas ouvindo sua voz é um presente. Apaixona com sua presença exata, seus gestos simples, seu corpo ágil.

(Melhor que José Mayer, só o meu amor.)

Seu leiteiro pobre demonstra tolerância e sabedoria com a mulher, carinho pelas filhas. É pai de moças que parecem fadas, tamanha a suavidade de sua beleza. Precisam casar, mas náo com os noivos que ele escolheu. E o convencem. Seu amor de pai enxerga o amor das filhas, precisa que sejam felizes. Ele até contrariará o rigor da tradiçao. Só não aceitará, contudo, o casamento da caçula, seu doce passarinho, com um russo; fora da fé náo há dignidade.

O palco pontilha-se de estrelas. Os personagens típicos da vida rural, o dono do açougue, a casamenteira, as fofoqueiras. O alfaiate. Temos ali um núcleo rústico, circular, completo.
Os atores tem o cuidado de adotarem sotaques levemente distintos, conforme a idade e a personalidade. Um trabalho de ourives sobre o talento artístico.

Não quero aqui discorrer sobre a técnica cênica. Riquíssima. Sobre as atuações impecáveis, sobre os cenários que são uma porta do túnel do tempo, a transportar o espectador para a Russia de 1905. Não quero falar sobre figurinos fiéis às pesquisas da época, e coreografias espetaculares de danças típicas. Sobre a fantástica cena do sonho, produçao de alta qualidade, onde somos brindados pela voz incomparável de Maria Bravo. Requinte e capricho.

Quero - quis - discorrer sobre a alegria de comemorar as raízes. Na platéia, judeus e náo judeus comemoram juntos: os primeiros, a trajetória sofrida e bem sucedida de seu povo.
Os segundos, a possibilidade de compartilhar esse nobre momento, e refletir, sobre todas as situações de preconceito e opressão, em que se omitiram ou foram também oprimidos.

Comemoram juntos a vida, marcada por alegrias e tristezaS, perdas e sucessos. Por novos planos. Por novos motivos para os mesmos costumes e rituais. Por estar vivo, ter identidade. Crer, inegavelmente, que vive da melhor forma. Com força, e com convicção.

Vamos brindar à vida, e ao talento, e a paz, que reine para sempre.

LE CHAIM, queridos, como dizem os judeus Le Chaim, à vida!!!!

foto: divulgação
José Mayer, incorporado pelo personagem Tevye
Suas filhas, as lindas e talentosas Rachel Renhack, Malu Rodrigues, Julia Bernat, Hannah Zeitune, Sophia Viamonte.

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