sexta-feira, 29 de abril de 2011

A boa da Sexta

Sexta
Sétima
Oitava
Milésima



A boa da sexta não é o bumbum da Juliana Paes
Nem a chatice da Kate - e a deselegância moral de seu matrimônio.
Nem os porres homéricos de minha amiga Amy

A boa da sexta é ser feliz

Camila e charles
Kate e William
John e Carolyn

Elizabeth e Richard

foram e são

no rio, em londres, em nova york

em são joão

Florentino e Firmina
Jorge amado e Zélia
Gil e Flora

e Drão

Madonna e Jesus
Cassia e Maria eugenia
Gal procura ainda pela sua pequena.

Jean paul e Simone
Piaf e Michel.

Gardel

Zélia Cardoso de Melo e Bernardo Cabral se entregaram ao som de Besame Mucho
Baby e Pepeu separaram mas se amaram muito,
e até mesmo o Papa deve ter lá seus momentos.

A boa da sexta é pensar
que se tantos amaram e foram felizes
você também pode ser,
o risco é necessário,
o amor é necessário,
entregar-se é necessário

talvez não precise ser aprovado
ou comentado
ou tocado na rádio.

Exemplar ou ultrajante,
o casal merece a sexta feira
já que a sexta é o dia da amante.

Nelson Rodrigues afirma que sábado não pode,
o sábado é das senhoras respeitáveis.
Vinicius diz que bem e mal acontecem porque é sábado
e eu digo que sábado é o dia de acordar feliz
porque a véspera foi sexta,
e fez-se o que bem se quis

Digo, repito, afirmo
A sexta é melhor que tudo,
E essa sexta teve o casamento real,
mesmo afrontoso e perdulário é um casamento,
e inspira os que amam
não negue: quem ama deseja viver com o ser amado.

porque o amor é para sexta, para a segunda, para o sábado,
para todos os dias da vida,
todos pontos terrestres e fusos horários,
faixas etárias
situações monetárias

estados civis e de sítio
calamidades
sociedades
modernidades

que a sua sexta seja de fato
o dia de mandar embora o cansaço
e correr para o abraço

porque o tempo passa,
as sextas se repetirão.
E sem amor, serão todas iguais,
Repetidas como um refrão.

- A boa da sexta meus queridos é amor no coração

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Charles e Camila

Um dia londrino
no meu Rio
chuva
frio

Príncipe Charles e Camila

A Inglaterra está na pauta do dia.
Seja com os impronunciáveis noivinhos (não digo o nome deles) ou com o espiríto de Diana, invocado dia e noite, em infrutíferas comparações....Senhores, as deusas são incomparáveis.

Recebo, de minha amiga Amy, forte indicada para o trono, um singelo e emocionado power point sobre o encantador e vitorioso amor de Charles, o orelhudo, e Camila, a senhora. O autor, cujo nome desconheço, atribuiu nobreza tal ao sentimento que os une que chega a compará-los com Florentino e Firmina, personagens de "Amor nos tempos do Cólera", do maravilhoso Gabriel Garcia Marquez.

Amy estava um pouco confusa, não sei porquê, achou bonita a homenagem, mas pareceu-lhe meio fora de foco.

Sim, há outro foco que precisamos observar.

Como são inocentes as pessoas. A marca do casal em questão está longe de ser o sublime amor de entrega e de superação.

O amor de ambos teve desde seu início a marca da proibição.

Este selo enaltece qualquer qualidade que se tenha. O proibido, desde o início do Homem, produz efeito hipnótico. Muda o rumo dos passos, das idëias, dos sonhos.
O proibido mexe profundamente com o ser humano. É sua oportunidade de provar que é o mais forte sob a face da Terra, e que sua vontade é imperativa.

Adão não resistiu ao fruto proibido, e eis aí a humanidade.

Compulsivos não se curam porque desejam o proibido. O proibido para esses extremados é uma obsessão, uma tortura fixa, que se realiza com o exagero e a sofreguidão da satisfação.
Para os demais,que não sofrem deste mal, contrariar as regras traz uma sensação de poder, de liberdade, de força. Não é sofrimento, é prazer.
A rebeldia é inerente ao homem; ele nasce rebelde e livre. O convívio social exige que se adeque, a coletividade é mais relevante que a individualidade. No tocante ao coração, terra que ninguém pisa, uma vez que os olhos dos rebeldes se encontrem, e se reconheçam, nada mais será como antes.

Quando Charles conheceu Camila, ela era casada, e mais velha. O casamento de um dos dois já seria o suficiente para traçar linhas e fugas românticas, escolher esconderijos, segredinhos picantes. Os dois nesta condiçao civil, multipliquemos as artimanhas por dois.
Há quem afirme que os homens casados são os mais interessantes; sim, os momentos são raros, preciosos, fugidios. Quanto às mulheres, há quem jure que um affair fora das núpcias embeleza, e que sáo mais cuidadosas nas fugidas de cerca.

O ser humano precisa de aventura e romance, mais que de pão.
Precisa mais de desafios que de facilidades.

Diana era formosa, era possível e adequada. Ele não quis.
Quis, e nunca desistiu, daquela que a monarquia, a Igreja Anglicana, e os demais seres do mundo, presos aos padrões de beleza e juventude, repudiavam para o Príncipe.

O Príncipe é um homem comum - desejava o que não podia ter. Demorou trinta e quatro anos para conseguir, e a vida agraciou-lhe com um presente especial: consegue seu trófeu na maturidade, quando então supostamente sabe usufruir com calma e tranquilidade os bons momentos da vida.

Para fechar, Bucowski: " O amor é um preconceito. Amamos quem conhecemos. Há dez mil pessoas no mundo que amaríamos mais se conhecêssemos, mas nào conhecemos, então não amamos".

O preconceito é uma cisma, e sob um ponto de vista, limitado porém real, o amor é muitas vezes, uma cisma. A gente cisma com a criatura.

Charles prova isso. Cismou. Não quis conhecer e amar ninguém mais. Rejeitou a bela Diana, e outras. Os tempos mudaram, Lady Di se foi, e ele conseguiu. Casou com Camila.

O proibido foi conseguido. Venceu.

Independente da teimosia real, prefiro Camila a Kate, e Amy, a todas elas.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Canudo mole em batata dura

Leme,
de perto, bem perto,
e de bem alto


Conhecem o ditado água mole em pedra dura?
Pois é. Agora temos também canudo mole em batata dura.

Ops, vou explicar. Imaginem um treinamento de uma grande empresa. Um dos conhecidos exercícios da dinâmica de grupo. Metade defende, metade ataca, a teoria de que um canudo de refrigerante, possa, de uma única vez, atravessar uma batata crua.

Argumentos esgotados, vem a demonstraçáo e eis que o negócio funcionou. De uma tacada só, o canudo atravessou a batata. Como? Ora, batata é água e amido, explica o facilitador. Associamos à pedra, mas náo é tão rígida quanto parece. O canudo, novo, virgem, digamos assim, é mais durinho do que parece, e em velocidade, funciona como um punhal. Em suma, a batata não é tão dura e o canudo não é tão mole.
Eu vi ali na minha frente. A batata ficou espetada por um canudo de plástico.

Ou seja, a lógica contrariada pela expectativa.
Ficamos especulando antes de realizar, e associamos erradamente.

A a vida, gente, é assim também.
Situações improváveis funcionam, se praticadas por habéis pessoas.
E principalmente, se náo ouvirmos os pessimistas. E se tirarmos da nossa cabeça comparaçoes equivocadas. Partimos de conclusòes erradas, por pura presunçáo.

As pessoas, (e suas batatas!), náo sáo táo duras quanto imaginam, e se permitem atravessar de vez em quando pelo inusitado. Tem seus pontos frágeis. Somos constituídos, como nosso planeta (e como as batatas), por um terço de água em nosso corpo. Movimentos internos acontecem em silêncio no nosso corpo e no nosso coração. Somos permeáveis, e ondulantes. Podemos reorganizar nossas estruturas...

Há surpresas.

Podemos tentar as maluquices da vida e perceber que não são maluquices.
São sinceras tentativas.
Tudo pode dar certo, disse Woody Allen. Sim, ele tem razão. As receitas do livro náo foram todas testadas, e em algumas, para jogar limpo, ficaram para outra ocasião. Ingredientes caros e difíceis de encontrar, deixamos isso de lado. Estão aqui no livro por erro de ediçao.

Ora, ora. Chega disso. Teste. Teste novas sensaçoes, novas idéias.
O novo assusta, é criticado, é impossibilitado pelo senso comum. O novo ainda náo foi catalogado pelo Inmetro. Mas só o novo fará com quem avance. Sem arriscar, você fica com a batata quente na mão, e com as idéias e sonhos velhos. Deixe-se ficar só com eles, serão sua companhia, porque ninguém quer repetiçoes. Por pior ou melhor que sejam, o ser humano precisa do oxigênio das novas experiências.

Encontraremos quem consiga entender nossos loucos pedidos, e quem torça para que deêm certo, e mesmo com dúvidas, apóie.
Quem acredite além das contas e das métricas. Quem veja, com os olhos do coração, a possibilidade de achar o ponto exato e o momento exato. E agir. Sem ação nada se modifica, nada se inova. Tudo se mantém dentro do antigo prisma, nem sempre favorável.

Vamos fugir da torcida do contra. Velocidade na fuga. Essa gente dá azar e se reproduz rapidamente.

Vamos focar no acerto, rápido, sem perda de tempo.
A cada ano que passa estamos mais sábios, mas temos um ano a menos.
E eu quero o acerto.

Na batata, na água, na pedra e na vida.
Dá cá este canudo que é a minha vez.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Chega do inimigo

Rio de Janeiro,
Chove
calo
escuto


O inimigo pode adquirir status variados: namorado, marido, amante. Você decide. É impressionante o número de mulheres que estão dormindo com o inimigo, além da Julia Roberts.

O fato é que o sujeito vil em questão faz mal à moça. Tripudia. Humilha, despreza (forma silenciosa de humilhação) e a moça está lá, firmona, bonitona. Ele marca às dez e desmarca às onze. Pede dinheiro, pede tempo. Não pode dar o que não tem; só dá amor, quem ama; só está alegre quem sente-se alegre. O sujeito vil está sempre emburrado. Faz de tudo para infernizar, bebe, briga, acusa. Dorme demais. Sai sozinho, volta altas horas. A moça não desiste. Perdoa e pede perdão pelo que não fez.

Encasquetei. Estou falando de moças bonitas e inteligentes, estudadas, perfumadas. Moças desejadas por outros homens.
Nào. Querem quem não as trata bem. Duas opções: ou sentem-se desafiadas a modificar a criatura, ou precisam de sua dose de baixa estima de vez em quando.

Fui pesquisar. "Inimigo: representa a parte contrária em uma disputa, partida ou conflito, seja por pessoa ou grupo, por suas idéias, pensamentos, atividades ou por razões políticas radicais." (wikinote)
Taí. Querem a disputa. A paridade e o companheirismo não interessam. Querem o estímulo da competição. Querem o atrito para aquecer a pedra e lançar a fagulha.

Só que a coisa cresce. Brigas na rua. Brigas de madrugada. Solidões. Choros. Frustações.
A brincadeira náo é mais brincadeira, a dor é de gente grande. O inimigo costuma ser mais forte, e vem mais preparado para o corpo a corpo.

Preparem-se mesmo, porque elas são boas de briga. Enfrentam até a exaustão, e são mais resistentes do que imaginamos. Reabastecem suas forças com trocas: horas valiosas de trabalho e estudo, perdidas, para analisar os fatos com as amigas. Trocam lágrimas e lágrimas e noites insones por um beijo mais quente. Sempre em desvantagem. Concluem nada, mas o desabafo e o beijo aliviam, e renovadas, insistem mais um pouquinho.

Desistir é uma questão clara de sabedoria. Se desiste cedo demais, fica a sensação de incompetência. Se passa da hora, o sofrimento passa do necessário; sofreu mais do que a lição exigia. O timing está em jogar a toalha antes que o lutador se machuque demais. É preciso sair do ring de pé.

Já vivi este enfrentamento.
Queridas, náo é ele o inimigo.
Olhem-se no espelho. Verão a verdadeira inimiga.

domingo, 24 de abril de 2011

Enjoada das princesas - quero a louca

Copacabana
Princesinha do Mar
Abril, 24.


Essa é a minha princesa

Estou enjoada. Nauseada. Mareada.
Como queiram.
Não quero mais saber de Kate, William e de atormentar o o espiríto da Diana.

A Inglaterra deixa para o mundo a Arte. Ponto.
Escritores, músicos, estilistas. Podemos fazer lista dos artistas ingleses, em todas as áreas.
Mas a monarquia, gente, pelo amor de Deus, a monarquia inglesa é a pirataria assumida; as pedras da Coroa Britânica saíram das grutas aqui de Minas Gerais, em santinhos do pau oco.
India. China, fizeram um apartheid na China, onde havia clubes para os ingleses, onde cachorros e chineses eram proibidos de entrar.
Quando detonaram os tesouros do mundo, fizeram a Revoluçao Industrial. A escravidáo passou a ter cartão de ponto. Ai, chega.

Kate e William náo participaram disto, mas estão vivendo como nababos por conta disso.
Enjoei, boicoto, viro a cara. A TV anuncia, mudo o canal. Ou escuto só para poder criticar com mais detalhes.

E as comparações entre Kate e Di?

Vamos reconhecer: Di era muito sem graça antes dos escandâlos conjugais. Tímida, deselegante, avermelhada, pouca voz, roupas que a engolhiam.... Bastou a dor da traição, e o sopro da vingança trouxe vida nova à musa soberana. Revelada, rosto em pétala, olhos brilhantes. Andar suave e longo como certas notas musicais. Dizem que levou toda a guarda, ou pelo menos os melhores, escolhidos a dedo, para seus aposentos reais. Fez bem.
Dizem que gritou com a Rainha. Fez bem também. Dizem que enfim foi feliz. Fez então MUITO bem.

Ontem uma amiga narrou-me uma frase comparativa entre ambas: Diana, disse "tenho sorte de ser princesa" e Kate, "ele tem sorte de me ter por princesa".

Se é para comparar, acho Diana mais digna - a sorte é dela, foi dela, a princesa era ela, e teve sorte de ser princesa, sim. Vestiu-se como quis, badalou onde quis, dançou com quem, teve lindos filhotes. Era sortuda sim. Sua majestade independeu do orelhudo Charles, que preferiu a velha senhora.

A frase de Kate demonstra comparação entre ela e o Príncipe. Gostaria de devolver-lhe. Querida, ele tem sorte por ter escolhido você, bonita e inteligente, ou qualquer outra, estamos em um mundo de mulheres bonitas e inteligentes. É o Princípe da Inglaterra, e todas as garotas do mundo poderiam estar no seu lugar, e quem sabe, no escuro da noite, não estejam... Ela já começou mal, a meu ver, se gabando da escolha alheia, sentindo-se superior ao outro. Que feio, Kate...
E ela? Tem sorte? Sabe onde está se metendo? Sabe que o mundo conhecerá seu guarda roupa, seus travesseiros e suas lágrimas?

Bem, se é para falar de princesa, prefiro a inglesa louca, que será lembrada pela sua arte, pelos seus vícios, pela sua assumida loucura. Não por usar jóias herdadas, roubadas, pelos vestidos (caros), e pelo chá na louça do protocolo.

Enjoei das boas moças. Quero a Amy no trono.

Incêndios - e silêncio

Estaçao Botafogo
Estava ali
e o mundo pegou fogo diante de mim



Queremos um mundo sem guerra



Bem, acho que nem devia escrever agora. Cheguei há minutos e estou atordoada.

Quero pedir: vão. Confiem em mim. Sobreviverão após atravessar o Líbano em guerra. Feridas? Sim. Cicatrizes? Sim. Privações? Sim.

Sairemos convictos da imensa injustiça: o destino de um ser humano é traçado a partir do ponto que ele nasce no planeta. Seu caráter rabiscará desvios, mas não há muito como fugir da reta riscada pelo Poder Superior.

Poderá ser um mártir ou um grande médico, se nascer no Irã, ou no Canadá. Uma mulher felicíssima ou uma adúltera a ser apedrejada, se nascida no Brasil ou no Líbano.

Pergunto: uma moça pode ter um filho com quem quiser, se amar, se desejar? No Brasil, sim. No Oriente Médio náo. Esse amor, e esse filho, e a guerra acabaram com a vida de Narwal, nossa mártir. Uma mulher marcada por profundas tristezas, incuráveis, por imensas. O mundo violento em que viveu era ainda menor que tanta dor. Nada do que pudesse ter feito, teria mudado seu destino, e ela fez muito. Esta mulher caminhou pelo deserto em guerra, sozinha, em busca do fruto de seu ventre, e ele havia sido levado dela novamente. Esperança destruída. Impotente face aos fatos, troca de lado. Era cristã, era assassina, era terrorista. O destino, que tudo tirou-lhe, arma-lhe terrível golpe: seus filhos só conhecerão seu amor depois de morta. Desprezados por ela em vida, entenderão tudo no fim. E o filho amado, em qual rosto se escondera? Qual ruína era seu esconderijo? Criado sem amor, sem pão, sem risos, sem beijos. Criado com tiros.

Tomara que se encontrem, e que fiquem juntos, seja como for.
" Nada é mais belo que estar junto ", último desejo de Narwal, tomara que ao menos ess se realize.

A guerra engoliu sua vida. Viveu sem vida. Mais não digo. Digo apenas que o filme é maravilhoso e horrível. O primeiro pelo talento de sua realização, pela perfeição cinematográfica, completa, inquestionável. E o segundo, pela cruel realidade que nos apresenta.

Saí atônita. Quero silêncio, em solidariedade à Narwal, e aos nascidos nos países do Oriente Médio. Em luto. Mesmo vivos, seu corações estão muitas vezes, mortos.

Quero que você, caríssimo leitor, reflita.

Aproveitamos sinceramente a nossa sorte?
Somos de fato livres e intensos como podemos?
Amamos nossos filhos com todo o coração?
Nossos pares? Desfrutamos os momentos em que estamos juntos?
Somos bons alunos? Leais amigos? Somos bons profissionais?
Gozamos da liberdade de ir e vir?
A liberdade de amar?

Sempre reclamando, insaciáveis... não sabemos nada desta vida.
Perdemos tempo, perdemos pessoas, perdemos conhecimento.
Exigimos, somos intolerantes.
Jogamos pela janela bens preciosos, e nem percebemos.

Eu devia ter escrito agora sim.
Não podemos perder um minuto mais.
Pelos que não podem, pelos que não tem,
por aqueles que não conseguimos atingir com doações milionárias e teorias político-econômicas, e que nem a comunidade internacional consegue salvar,com a ONU e suas ligas, e a Cruz Vermelha.
Por aqueles a quem os anos negam a benção da consciência tranquila.

Não vamos desperdiçar um segundo. Vamos viver em plenitude, e em PAZ.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

A Páscoa de hoje

Rio de Janeiro
Sexta Feira da Paixão




Boa Páscoa, queridos amigos.


Que não tenhamos, Senhor, no dia de hoje
nada no coração que não seja paz, o primeiro passo para a alegria.

E que façamos de conta que ontem não foi dia de Tiradentes,
e quase ninguém lembrou.
Dele ou de sua causa perdida.

Enforcado, mas não o enforcado do Tarot, enforcado a mando dos ingleses,
aliás, ontem foi aniversário da Rainha Elizabeth II,
e ela foi à missa, anglicana, protestante, sei lá.
Ela, monarca que descende de monarcas
alvos ladrões dos tesouros brasileiros, indianos, chineses,
e claro, do ouro e diamantes dos africanos - ela que se farta
da fome do mundo.

Que não escutemos que os preparativos para o casamento do príncipe estão a toda.
O acompanhamento jornalístico deste evento deve ser objeto de pesquisa,
e boicotado.
Sim, porque é pago pelos cofres anglo-saxônicos,
onde há bastante dinheiro,
estão abarrotados e sabemos da onde veio.

Ah, que eu não lembre
que hoje cedo foi enterrado o atirador de Realengo,
e que nenhum programa de acompanhamento terapêutico está disponível
para nenhuma comunidade carente.

Afora isto, que eu pense na pequenina Vitória salva da caçamba,
por dois anjos travestidos de homens,
como a diminuta Yara das águas mineiras também o foi.
- entre outros exemplos,
de que há anjos entre os homens da Terra.

Que este dia da paixão esteja mais para um canto de liberdade,
uma nova carta da liberdade de Mandela.
Da riqueza para o povo,
Da África para os africanos,
Do Brasil para os trabalhadores brasileiros.

Não seja mais uma encenação da crucificação de Jesus,
Com suor, sangue e lágrimas.
e que acabado o espetáculo sigamos para a casa comer chocolate
Enquanto o Papa tem sapatos de 6 mil e quinhentos euros, que sustentariam uma família por um ano inteiro.

Não, desta vez náo.
Que venha da Paixão a multiplicação da Sua Verdade - amar o próximo.
Essa é a melhor religiáo.
Sem missas ou vigários,
Sem velas,
Sem dizímos.
Sem perdulários.

Comecemos hoje nosso apostolado.

Que a Páscoa seja seguida de mais justiça social e menos fotos em Caras,
sem aplausos ao usurpador,
sem reverências ao príncipe,
que da tirania econômica é
o legítimo sucessor.
Seguida de mais equilíbrio nas relações internacionais,
Mais dignidade.

Que nos lembremos disso nas eleições,
e nas revoluções.

A ação se resume em uma palavra tão repetida,
que o seu valor se perde no dia-a-dia.
Palavra subvertida,
mal entendida.
Deturpada por leigos e religiosos,
e usada para distintos fins,
para convencimentos,
para ardis.

Aqui vem em maiúsculas,
carregada da sinceridade típica dos pedidos infantis

- Tudo se resume a agirmos com AMOR.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Os 10 Pensamentos

Arpex
Abril


"Todo dia quando acordo
Não tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo " (Renato Russo)





O primeiro pensamento do novo dia
é sua imagem.
Voz, rosto, e beijo.
De uma vez.
O segundo é que não te tenho
O terceiro é que não quero levantar

Também, são três horas da manhã.

O quarto é que preciso colocar os pés no chão
e o corpo em perpendicular à cama.
Meu caçula precisa de ajuda nos deveres
e há mil ligações eletrônicas que eu preciso auditar.

O quinto portanto é que cheguei ao trabalho
Olhando ninguém diz:
perfume, casacos, sapatos de salto.
Fiz de tudo para disfarçar.

Vamos portanto, trabalhar.
o dia segue até o sexto pensamento,
entre 13:30 e 14:00,
quando nos falávamos - era bom, não?

Em silêncio, sigo até o sétimo.
Sete pecados, sete cores, sete notas musicais.
Sete vidas

Sete vezes te renego
e por outras sete, arrependida, remendo e conserto.

Oitavo: chego em casa.
Muito errado. Vejo torto e mal encaixado.
A casa não é minha, os filhos são emprestados pelo Plano Espiritual
para que eu me aprimore enquanto pessoa.

Não sei, sinceramente, se está funcionando.

O nono pensamento - gosto do número nove, é mais reconfortante.
Mais um dia passou e nada me aconteceu.
A fome e a injustiça social continuam
A arte continua
e há (poucas) almas boas.
O mundo segue, eu também segui.

Estou aqui.

Penso que cumpri,
dei cabo de mais um dia.

O décimo pensamento me condena,
tal qual o décimo mandamento,
cobiço o que não é permitido.
E por mais que meu coraçao peça
que eu saia porta afora em desabalada carreira ao seu encontro,
proíbo-me.
Fui proibida.

Um décimo primeiro sussurra em meus ouvidos.
Irrelevante, frágil diante dos que o antecedeu

O décimo primeiro diz que isso tudo vai passar.

Besame Mucho - y por siempre

Leblon
Leblon
de novo, que bom


Foto: Divulgação
Texto: Mário Prata. Direção: Roberto Bomtempo
Elenco: Rafael Sardão, Leandro Baumgratz,Janaina Moura e Ana Paula Sant´Anna


"Que tengo medo perder-te
perder-te después"

Não queridos, não é recaída pelo argentino com quem vivi dos dezenove aos vinte e quatro anos de idade, com intervalos que me permitiram sobreviver.

Meu coração, graças a Dios, está em paz.

Lo que pasa, é que assisti uma peça muito muito muito especial. Vinte anos de cartaz, e a punhalada tem a mesma força.
Começa do fim para o começo. Brinde: projeções fantásticas que ilustram os anos de 1982 a 1960 através de seus ídolos. Um documentário mudo, uma retrospectiva do Brasil em imagens. Adoro projeções.

O release fala que o espectador será um voyer. Para nada, para nada, como dizem os portenhos. O espectador sairá é surtado, pensando em sua vida e em sua relação com o sexo, principalmente.

Ou temos sexo demais, e confunde-se com fartura de desejo, podendo ser apenas compulsão. Escapes.

Ou temos de menos, porque nosso par virou irmão, ou pai, ou mãe, e ao contrário dos incestuosos, irmãos, pais e mães não dão tesão em ninguém.

Ou a pessoa não se satisfaz, ontem não te satisfez, embora tenha feito quinhentas vezes de quinhentas formas, e se diga feliz assim.
Orgasmos falsos, perseguem os verdadeiros, fugiram.
Enganos na cama e no casamento.
Fantasias desesperadas.

Ou o prazer varia, o que é interessante, se há sintonia, ou cruel, se náo há.

O cara que precisa contar os feitos.
O cara que mente sobre os feitos.
O cara que ama o outro cara, e não sabe, ou não quer.
Porque ama o cara e a própria mulher,
e deseja também a mulher do cara.

e então brochou, porque a multiplicidade de opções (já expliquei a origem da expressáo? não? fica para próxima) enlouquece, e no caso dele, brocha.

E outra, a relaçao da pessoa com a profissão.
Henry Kissinger disse que o "sucesso é o maior afrodisíaco". Sim.
E quanto ao sucesso que é farsa? Quanto ao sucesso montado, como fachada, sem pseudônimo, por trás não há nada, talento, empenho, nada?
Esse sucesso existe e náo excita ninguém.
O cara é rico, amado pela crítica, mas é sua esposa (atualmente irmã) quem escreve suas peças. E ele perdeu o tesão nela. Ela é melhor que ele, sua superioridade o afasta, ele precisa ser o melhor, o ser superior.
Ah, o bicho homem. Sempre quer ficar por cima...

Só para fechar. No palco dois casamentos. Duas outras farsas. Um está pensando no outro, náo no seu par, mas no outro marido.
Separar-se? Partir para outra? Descobrir se é gay?
Nào, temos as crianças. Ótima desculpa para o medo.
Vamos a nova sauna, à tarde tem promoção. Consolamo-nos as moças, e eu aproveito e te vejo nu ao meu lado, o corpo que desejo e não posso ter.

O casamento faz bem quando não é pelas crianças.
O sucesso faz bem quando é real. O sexo faz bem quando é entrega.

Afora isso, finja. Prossiga.
Ou parta.
E beije, antes de partir.

Aversão - a Comédia

Faculdade Cândido Mendes
i p a n e m a
Abril começou, e veio esquisito
é preciso ir ao teatro


Leandro Lamas e Mariana Rebelo, texto dela, direção de Rodrigo Santanna
Foto: Divulgação



Tenho direito à minha versão dos fatos.
E como testemunho em causa própria, não estou obrigada a dizer a verdade.
Só que meu depoimento será entre risos, muitos, até chorar de rir. Convencerei pelo lúdico.
Debocharei de tudo: dos convites, das festas, das viagens. As lembranças doem, então as maquiarei com muitas gargalhadas.

É isso, gente, a peça é isso. O casal jovem se separa depois de três meses de atrapalhado convívio. Incompatibilidade de temperamento e comportamento. Contarão, cada um por si, sua versão.

Um casal é composto por duas pessoas (pelo menos oficialmente) e cada uma tem sua visão.
As explicações sáo opostas entre si, e há de haver um herói e um vilão.
A posição que você ocupa modifica toda a sua perspectiva da coisa. Você sempre teve as melhores intenções, esse insensível é que pôs tudo a perder.

Se quiser, pode viver assim mesmo. A culpa é do outro, náo sua. Empurre para ele vai ficar mais leve para você. Somos criados para buscar o culpado, por fora e não por dentro.
Mas aguarde a chegada das três manhã, e o toque pontual do despertador da sua consciência. Se puder, reflita.

Os atores estão ótimos. Luzes fortes demais derretendo-os a olhos vistos, não perdem a pose. O cenário é de caixas, vê-se que estáo de mudança, e levarão convicções distintas.
O figurino é via de regra único, e como em brincadeira de criança um colar vermelho indica roupa de festa, e um chapelão com óculos escuros, que estáo indo para a praia. Taças vermelhas transparentes convidam para um drink romântico. Saídas ótimas e de baixo custo.

Dão seu recado lindamente, beiram a caricatura viva.
Aliás, a caricatura é muito útil: permite apontar defeitos sem ferir. No maior fair play. Meus defeitos ali, e posso rir deles, é uma catarse para os presentes. Muitos casaizinhos estáo se identificando, claro que foram lá para isso.

Aprendi muito. Como há décadas passadas, o micro palco da minha Cândido sempre me ensinou algumas coisitas. Por exemplo, lá aprendi que não poderia ser advogada. Confesso, lembrei-me de dias e dias em que matei aula para assistir ao teatro.
Como não percebi que estava construindo uma versão torta dos fatos? Onde você foi Bettina? A Aula de Direito TRibutário? Fui. (Mas acabei indo ao teatro. Jamais disse isso, mas era o que acontecia)
Que injustiça construir uma versão sobre mentiras. Naquele momento era mais fácil assim.

A vida é assim. Temos uma versão para cada momento. Justificativas.
Escolhemos a versão que melhor nos atende, ou muitas vezes não escolhemos, ficamos ora lá, ora cá.
Estou ainda influenciada pela Bailarina de Vermelho,e permitindo-me trocadilhos cafoninhas. Tenho versões. É uma versão, ou não, mas são sim, possibilidades. São versões.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Dias e Dias

Copa
Copa bacana



Há dias em que desejo ser uma pessoa diferente
estar em outra pele
ser de outra etnia,
de outra religião,
de outra história e tradição.

Há dias em que eu queria mesmo era esticar
minha pele sobre a pele do mundo
e me alongar
pelas veias de rios
de sangue
pelas veias das estradas no chão.

Ha dias em que tenho sede
e nem todas as cachoeiras me refrescaráo
terei mais espaço do que onde caibo
e menos dimensão

Há dias em que necessito de extrema liberdade
em outros busco quero a concha da solidão.
Há luta, há agonia
- dias em que me ataca a claustrofobia

e penso que uma vida só é pouco para mim
nem que quisesse, eu poderia
com um único corpo sem asas
alcançar os caminhos que desejo
assim nesse passo não poderei experimentar
e como poderei afirmar se é ruim
gostoso horror ou maravilhoso

Certamente só posso dizer se experimentar.
Foge-me a capacidade de imaginar.
Imaginei demais, e equivoquei-me.

Quero ver as cidades
construções
desertos
multidões.
Livros sem fim para ler
e as pessoas que os escreveram.
Praias quentes
e seus frios noturnos.
Gostos
há rostos
há políticas democráticas
há revoluçoes
e guerrilhas e aristocracias
debates
opiniões

tudo me convida,
náo posso comparecer.

tenho que estar aqui para as contas do fim do mês
tenho que estar aqui para o horário do treinamento
tenho que estar aqui para educar meus filhos

tenho
tenho
tenho

queria ser mais doida um pouco
(acho que um pouco só basta)
e sair de mochila pelo mundo
sem maiores obrigações.
Também não quero sonhos
Sonho nenhum, cansei do sonhar.
Só o dia a dia,
todos os dias
meu sonho é náo precisar sonhar
necessito realizar

partir planeta afora
em movimento maior
girando em transalaçao

- Há dias em que girar em torno do meu próprio eixo
me enjoa

domingo, 17 de abril de 2011

Saltimbancos - ricos e livres

Ipanema, para sempre

                                                              
Foto: Divulgação
De baixo para cima: Telma Leite, Ruben Gabira, Maria Lucia Priolli e Claudio Gardin


"Nós Gatos já nascemos pobres
Porém já nascemos livres,
Senhor, senhora, senhorio,
- Felino! Não reconhecerás
" (Chico Buarque)

Livres e, portanto, felizes,
já que náo há nem pode haver,
riqueza maior que a liberdade.

E digo, mais felizes que os humanos,
que nascem indefesos,
e presos portanto,
a quem os cuide,
sem o quê não podem sobreviver.

Sim, eram explorados no campo.
Eram cativos na mansão.
Os bichos então fugiram,
e partiram para a cidade,
em busca de música e liberdade.
Que pena.
Viram que a cidade não era de crianças,
era de adultos,
continuariam escravos do patrão.

(Os adultos nascem bons,
mas podem tornar-se maus,
e espantarão os bichos e as crianças.)

Os bichos de Chico são sábios, muito sábios.
Viram que o sonho trazia perigo,
desistiram,
voltaram para o meio do caminho.

Construíram um lar deles,
de todos eles,
felizes, iguais,
sem senhorio,
na cantoria,
o jumento, a gata,
o cão e a galinha.

Sou obrigada a cantar com eles.
O meio do caminho é um lugar muito aconchegante,
se arrumado com capricho
com jeitinho,
o sítio parecerá um castelo lindo,
e nos protege, com carinho,
de sonhos ousados, arriscados.
Ali podemos ficar juntos,
e ter sonhos mais seguros.

Eu, você,
os saltimbancos,
os libertos,
os espertos,
os puros.
Vamos para o sítio,
onde a liberdade é total,
onde todo mundo é igual,
e onde a gata canta toda noite,
onde não existe certo ou errado,
onde o cachorro é o soldado,
a galinha a cozinheira,
o jumento manda no pedaço,
e a gata é a estrela.

Este espetáculo está em cartaz há trinta anos.
Escrito em 1977, por Luiz Bardotti, com músicas de Chico Buarque,
foi inspirado no Conto "Os músicos de Brêmen", dos Irmãos Grimm. Trata da reorganização das forças de trabalho: os explorados não se permitem mais explorar e passam a trabalhar para si, com funções claras para cada um, de forma que se sustentem com dignidade.
É a prática poética e em versão lúdica, de uma das máximas do comunismo:
a cada um conforme sua produção, e a cada um conforme sua necessidade.

Ouso acrescentar que o ideal mesmo, para nosso convívio social, seria: a cada um conforme sua felicidade, entendida como um consenso da boa vontade, do exercício da liberdade responsável, com respeito a felicidade alheia e desfrute da sua própria.

Eu vi no Teatro Ipanema, nesta montagem da Cia de Maria Lucia Priolli, todos os adultos da platéia em coro, a cantarem, a plenos pulmões, a canção do Gata, e da Galinha. Uma maneira linda de dizer que ainda temos, e teremos sempre, a vontade (e o objetivo) de uma sociedade mais justa, e mais alegre.

Meu caçula, Pedro, e a galinha, a Maravilhosa Telma Reis

Anticlássico - é, ou são, questões

Humaitá,
Embaixo da Lua,
e do Cristo.
Vi uma doida bailarina

Alessandra Colasanti, Foto: Divulgação

Noite de sexta. Eu a amiga querida seguimos, depois de trabalho árduo, para um pouco de lazer. Teatro no Sergio Porto. Descemos no lugar errado. Caminhar, caminhar, caminhar. Botecos lotados, somos cariocas, e de uma forma geral reservamos as noites de sexta para barzinho e samba; as noites de quinta e domingo para cultura. Sábado? Bem, melhor nào comentar.

Em frente ao teatro, na verdade por cima, brilha o Cristo.
Minha amiga faz uma prece, pede proteção, e agradece.
Ela também é bailarina, mas náo de vermelho, de preto, le rouge et le noir n'épousent-il pas ( o vermelho e o negro náo se misturam), mas estarão juntas pela próxima hora e meia.

É impossível náo se juntar a esta doida que nos falará em monólogo. Já disse e repito: adoro as doidas. São elas que movem o mundo, e nesta noite, a doida é Alessandra Colasanti, a atriz e diretora do ANTICLÁSSICO.

Assume, ao vivo, a cores, e ao meu humilde ver, duas personagens: uma conferencista, uma bailarina, e de novo a palestrante em postura mais relaxada depois de um drink e uma música ambiente. A diferença entre ambas não é clara, misturam-se, parecem o presente e o passado fora da ordem cronológica.

O que segue é uma sátira, uma provocação, uma ridicularização dos pretensiosíssimos personagens do mundo acadêmico; os que inventam jargões, filosofam o tempo inteiro, egolátras, repetitivos, enfáticos, e porque não dizer, charlatões.
Todos conhecemos algum. Já tivemos aula com algum deles, assistimos entrevistas deles, e principalmente, nos envergonhamos por eles, e pela sua platéia, que finge entender e concordar, só para náo parecer menor em cultura.

O texto é rico, riquíssimo, refere a filósofos e pensadores de diversas nacionalidades e crenças, e deve ter estudado muito para elaborar uma crítica tão bem ilustrada e vasta. Penso em Caetano Veloso, a quem idolatro, que náo foi citado e que não é charlatão, e que inaugurou a expressão "ou não" ao fim de cada afirmativa, para dizer que ambas as posições - contra e a favor - são possíveis, são opcões, ou como diz a bailarina conferencista, em tom grave, são questões. Eis, portanto, a questão. Se tudo é possível, e aceitável, fica mais difícil escolher uma opçãozinha só.

Lembrei-me de uma mulher inteligentíssima que conheço. Disse-me, não esquecerei, que a multiplicidade de opções enlouquece. Sim, é uma questão. Optar por menos opções, simplificar. A sua escolha e a do outro. Muitas opções confundem qualquer convicto, porque se todos os caminhos levam a Paris, por qual afinal, irei? Há criaturas que fazem isso com a gente, mostram mil itens, todos viáveis, e quase nos convencem que somos nós os que não tem o necessário poder de decisão. Na verdade, são elas que estão perdidas.

A linha seguida pela Bailarina Palestrante, a chamo assim porque não revela seu nome, para engambelar sua audiência, é a seguinte: muita conversa, muita demonstração de cultura, muito elogio a seus feitos e sua irresistível personalidade. Quero ver quem sabe mais que eu, mas por ora vamosarrebitar esse bumbum para cima, e lamber ascintosamente os próprios lábios. Ela quer também o prazer que a vulgaridade permite. Talvez use sua suposta cultura como a teia da aranha: cai ali e ela te come. (tive um amigo que usava como arma de sedução sua coleçao de direito romano. Onze volumes comentados por ele, à mão, em letrinhas pequenas, a lápis. A moça abre a blusa no quarto volume.)

Bem, adorei. Adorei a ironia, a fortaleza e a fraqueza da coisa.
É a talentosa elaboração de uma audaciosa idéia. Como detalhe, delicioso, subjuga a figura masculina, reduziu seu Hamlet, mais jovem e menos culto, a um nada, um mordomo mudo, um objeto cênico, um abatjour. Vingança para as mulheres presentes. Metafórica, paradoxal, dialética, dicotômica. Ou simplesmente, dúbia; o lado A é verdadeiro, o lado B, Falso, e os dois tocam em alto volume.

É uma falsa intelectual, uma falsa bailarina, uma falsa sedutora. Fanfarrona e presepeira, óculos de professorinha de filme pornô e balelas sobre romances com toda - TODA - a academia de Belas Artes européia.

Uma verdadeira atriz, uma verdadeira diretora, um verdadeiro espetáculo. Sem enganação.

Bravo.

Bravo, bailarina. Bravo.

sábado, 16 de abril de 2011

Palavras apenas

Rio, Posto 6.
Forte dourado
Noturnas ondas
Noturnas areias
Noturnas palavras
Vem o canto da sereia


Posto 6


Palavras ao mar.
palavras pelas pedras
pelos peixes.
Por onde quiser,
palavras para lavar.
palavras para ressoar.

Palavras de amar,
Palavras de chorar,
Palavras de rir,
Palavras de cantar

Não importa

Palavras para transformar
O que se sentia
Com outro olhar,
Com mais amor
Ou mais dor,
Ou quem sabe,
Só para ajustar
o amor e a dor,
só para calibrar.

Palavras eficazes,
lacônicas, prolixas,
audazes.
Simples ou eruditas,
palavrões,
ou outras palavras feias, para coisas bonitas.

Sua única qualidade
é a sinceridade com que são ditas.

- não precisam rimar,
nem estarem gramaticalmente certas
ou politicamente corretas -


a qualidade relevante das palavras

é revelar.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

O vôo da amiga

Rua da Assembléia,
Centro, Meio,
Marco, Nervo.
Ponto de partida para o começo.

Decolar sem medo


É preciso coragem.
Minha amiga tem, e como.

Deslumbrante, como são as minhas amigas. Esta tem um plus - sua personalidade é um furacão. Remexe profundamente e com rapidez a poeira estagnada.
É incisiva em suas observações e atos. Nada de superficialidades ou demoras.
Vamos agora e vamos para valer.

O cara nem sabia com quem mexeu. E mesmo ela, não sabia do que era capaz.
Alguns homems não reconhecem a peróla; enxergaráo, mais facilmente, os farelos.
O bicho homem em questão nunca teve uma mulher com tal cultura, tal beleza, tal coração. Tal poder de decisão.

Assustou-se. Preferia o conforto de não ter que melhorar.

E enrolou-se. Mentiu. Arrumou o argumento, pediu um tempo. Tempo? Detesto isto. Náo há tempo a perder,
ou passa-se tempo junto, ou separa-se o tempo, fica cada um com o seu.

Bem, havia planos que estavam na prateleira, aguardando o tal tempo.
Um deles, lindo e colorido, era uma viagem para a Florida, para esquiarem n'água e compras náuticas. O cara era chegado no alto mar.

O plano, quando é plano, te incomoda. Te cutuca e te empurra para fora da cama.
Faz contas para você. Faz até suas malas. Era assim para ele, que resolveu ir com outra. Era assim para ela, que foi informada desta traição. Soube que o roteiro seria interpretado por outros atores. Ela fora excluída da cena.

Mas gente, mulher furacão não é assim não. Ninguém a exclui. Quem determina espaço, fala, cena, iluminaçao e fundo musical é ela, quem mais? Ela consegue reservar lugar no mesmo vôo e me avisa que vai embarcar. Peço que náo vá. Tento demover, temo um problema aéreo de consequências internacionais.

Calo-me e entrego a Deus.

O que segue é o esperado. Minha furacão depara-se com aquele que até dois dias antes fora seu marido. Depara-se com outra atriz em seu papel, sem o necessário phisique du rôle, se me faço entender. Sem calma. A classe está em enfrentar a dificuldade com calma. A sucessora fala alto, gesticula, nervosa, náo entende nada. Afirma em altos brados no check list que formam um casal.

Essa gente me intriga. Formam um casal rapidamente. Assumem sua expectativa amorosa rápida e facilmente. Declaram seu estado emocional, mais valioso que o civil, publicamente.

Para minha amiga, bastou manter sua habitual pose. Embarcou, altiva e vitoriosa, em poltrona próxima, da onde via e era vista pelo casal. O avião levanta vôo, e há três protagonistas neste drama, cada um de seu monólogo: o sujeito, constrangido, raivoso, reativo, inconformado de ver seus planos ruindo. A minha furacão, doída, altiva, superior a essas falcatruas. E a coitada da substituta, longe de poder interpretar o papel e perdida no texto mal decorado.

Chegam ao destino depois de oito horas de convivência forçada. O sujeito esteve por oito horas sem máscara. Deve ter até estranhado.

Alguns passageiros mais sensíveis perceberam e observaram. Houve quem fizesse, silencioso, uma prece, para que os corações se acalmassem.

O vôo kamikase foi um sucesso. Aterrisou em terra abençoada.
Ninguém morreu, além do sonho. O tiro de misericórdia matou a ilusáo.

Tudo deu certo. Saem porta afora, alfândega afora, Florida afora.

Vida nova afora.

Minha amiga aperta o casaco, chiquérrima. Os cabelos negros brilham mais que nunca. Empunha seu Ray Ban original. Olha a hora em seu Swatch original. Náo é mulher de imitações, de limitações e de falsidades. Quer o original, direto da fábrica, de primeira linha. Sem truques, e sem recall.

Venceu. Seu ato corajoso salvou sua dignidade, o artigo mais caro de sua personalidade.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Tudo se resolverá em 3 semanas

Rio de Janeiro
Coração de Copacabana


De novo o rádio e suas notícias.
O locutor informa claramente
que em 3 semanas a Escola de Realengo
receberá de novo seus alunos.
Esse prazo foi estabelecido por psicológos e educadores.

Não haverá cerimônias,
nem homenagens.
Nem flores.
Não há tratamento terapêutico.
A educação precisa prosseguir.

Três semanas será tempo suficiente
para que a processo didático prossiga normalmente.

E no primeiro dia da quarta semana estarão uniformizados
em suas salas.
Atentos aos professores,
ignorarão os fantasmas.

Algumas pessoas me intrigam.
Trazem para si o poder raro de definir situações
indefiníveis
e de prever prazos e consequências
imprevisíveis.

Carregam altivas, ou em discreta postura
Fórmulas e receitas
para uma existência melhor e mais segura.

Chocam-me.
Passarei um e mail para eles
perguntando em quantos dias estarei curada.
Hei de me dirigir a esses sábios que passam ao largo das feridas
e afirmam que decorrido o tempo estarão cicatrizadas

"- Prezados,
por favor.
Carrego cicatrizes de longa data
que não fecharam.
Ardem.
Não fui informada do tempo hábil."

Agora já sei que para os sobreviventes é diferente.
Em três semanas a rotina falará mais alto que a dor
Em três semanas os alunos voltarão a estudar
Em três semanas voltarão a ter horários e disciplinas
Em três semanas brincarão no pátio.

Está dito por eles: será assim.

Quem quiser acredite,
no locutor,
nos psicológos,
nos loucos
ou em mim.

terça-feira, 12 de abril de 2011

A boa notícia

Copacabana,
Caymmi
Drummond
Maresia

Copacabana, Posto 6

Um dia depois do outro.
Um dia de cada vez.
Entendo que só por hoje esquecerei a pontada,
só por hoje.

Com este simples e persistente pensamento
Anônimos se curam diariamente.

Servirá para mim também.

Ligo o rádio, a música invade - ouço Nando Reis
E ele diz que "a vida é uma irrelevância
Diante da eternidade do amor de quem se ama"
Concordo - amar é o que lhe dá importância.

Para não cair em tentação, mudo de estação.
Notícias:
O cara matou sem dó 13 crianças
Com armas compradas da Polícia.
Teresópolis não foi reconstruído ainda.
No entanto o destruído Japão se ergue, dia a dia.
Concluo que no Brasil a vida é menos relevante
que no restante
do planeta.
Ou simplesmente no Brasil amamos e vivemos sem a menor importância.

Outras notas de violência e corrupção em meio a poesia de Paulinho da Viola
Em meio a Cartola
Em meio a Diogo Nogueira.
Notícias que me dão medo de ser brasileira.
Presto atenção
Um canta que o coração é leviano. Sim.
O outro que o mundo é um moinho. Sim.
Diogo canta que madame não gosta de samba. Não.
Gosta sim.

(O samba é leviano, madame samba. Somos levianos,
e lutamos para não sermos tragados
pelo moinho.)

Apesar do medo, sou brasileira nesta Terra Adorada
Que hoje está espetacularmente ensolarada,
Só por hoje.

e a boa notícia,
ao menos para mim,
é que estou viva.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Mostra de Cinema Francês - MAM

MAM
Ver o Museu de Arte Moderna
Ver a Modernidade
E a Arte

Martine Carol, uma deusa, em Lola Montés

Digo, repito, volto a dizer: é divino viver no Rio.
Farta cultura, grátis ou quase, em meio a farta natureza, e obras de arte espalhadas e misturadas em isso tudo.

O MAM tem que ser mais incluído na rotina do carioca. É uma plataforma de cultura, suspensa e paralela à Baía de Guanabara, para onde convergem, ou devem convergir nossos caminhos. O meu convergiu para lá no domingo. Fui assistir um dos filmes da Mostra de Cinema Francês, não posso ficar ao largo deste evento. A Mostra é grande, maior que um única exibição, claro, e não pretendo falar da Mostra e sim do filme, fantástico, irônico e amargo que representa com honra o cinema francês, de forma geral fantástico, irônico e amargo.

Assisti Lola Montés. História real de triste fim. Um mulher lindíssima, que viveu entre 1821 e 1861 e morreu em seus quarenta anos, ainda bela, porém decadente. Serve dizer que balançou o Reino da Baviera e foi um dos motivos - talvez o mais forte - para que o Rei Ludwig entregasse a Coroa. Desmoralizado por amar.
Esta é a realidade da vida, queridos. Muitas vezes o amor desmoraliza.

Lola não amou outro senão o Rei. Usou-os, a todos, para prazer e luxo próprios, e pagou na mesma moeda: encantaram-se o compositor Listz, Alexandre Dumas, filho e toda a curriola intelectual européia e americana da época. A moça tinha fôlego e dava conta do recado, com graça e escandâlos. Era estrangeira para a maioria de seus amantes e confessêmos que o sotaque francês é de fato convidativo a alcova.

Porém, ela cai. Há um momento em que o ser humano quer sossego. Não tinha onde sossegar, e termina doente, só, e sem recursos financeiros.
O Rei, com quem provou o doce sabor da estabilidade, foi-se com a Revolução.
A musa não era mais adorada por poderosos, requisito ímpar para ser musa.

O diretor alemão Max Uphols a retrata em seu fim - uma criatura enjaulada, em circo bizarro, a quem paga-se um dólar para beijar a mão. Peter Ustinov é o dono do circo, um cafetão caricato que a idolatra enquanto a explora.

O triste fim, que bem conhecemos, comum a outras que viveram de sua beleza. Terminam em liquidação, pública ou privada. O corpo que muito valeu, não vale mais nada ou quase nada.

A beleza é uma cruel qualidade.
Egoísta, retém o foco em si, e não se enxerga mais nada; finge ser suficiente, abastada, e não é. A beleza devia ser retirada de algumas mulheres, e substituída por amor. Tudo que se precisa, na verdade, não é ser bela, e sim, ser amada.

domingo, 10 de abril de 2011

Há pessoas melhores que eu

Orla de Ipanema
Horizonte do mundo
MAM
Horizonte da Terra adorada


Esta semana, excepcionalmente, sinto que náo devo comparar-me a outras pessoas.
Trago amarguras que pesarão contra mim. Tentarei ser imparcial comigo mesma.
Amarguras à parte, estou convencida: há muitas pessoas melhores que eu.

Usarei o domingo como amostra, digamos, estatística.

Comecemos pela manhã. É preciso alimentar-se bem pela manhã. Ler os jornais. Ter pensamentos otimistas para o dia que começa, e se possível, fazer amor pela manhã. Fiz o que estava ao meu alcance e saí para caminhar.

Apertei-me em uma legging. Pensei: tenho que parar de comer pão. Ai Jesus. Tanta gente sem pão no mundo e eu reclamo do pão que tenho. Tanta gente gostaria de tomar o café da manhã que tomei, e eu aqui reclamando. Pronto. Já há gente mais merecedora dos meus pãezinhos.

Sigo. Estou aparentemente, muito bem, fones nos ouvidos, traseiro marcado na legging justissima. Lêdo engano. Por dentro, reclamo da calça, do fone e da programação da rádio.

Páro. Um casal em um banquinho, à sombra. Belos, jovens, vinte anos. Sentados comportados, lado a lado, a mesma inclinação dos ombros. Não se tocam, mas são namorados certamente. Tem a mesma calma, o mesmo relaxamento do corpo, estão ambos de chinelos, confortáveis, são harmônicos. Bate um vento nos cabelos da moça, que balançam, lentos. Tem um cachorrinho lindo aos seus pés, e olham para o bichinho, também tranquilo como eles, do mesmo ângulo, e com o mesmo carinho. Tudo muito pacífico.

Pronto. Já encontrei logo de cara dois terráqueos melhores que eu. Nunca fui assim serena. Nunca fiquei calmamente sentada ao lado de meu amor. Estou sempre falando e explicando e contando e gesticulando, e ouvindo atentamente. Enfim, há uma certa urgência na troca de informaçoes, preciosas demais para que se percam. E mais, esses dois parecem estar alheios ao ambiente, como se pousados momentaneamente por ali. Ai de mim. Estou sempre absorvida pelo ambiente, enraizada, ávida.

O frescor deste casal indica, seja pela pouca idade, seja pela aura de tranquilidade, que desconhecem o potencial bélico do amor. Sào mais inocentes que eu fui na idade deles. Mais suaves. Há um desarmamento visível. Conheci, desde pequena as decepções profundas que o amor pode trazer. De fato, entrego-me numa atitude meio imprudente, não relaxo. O casal está em um momento mais nobre, diante do sublime sentimento. Deixaram-se invadir. São mais sábios em sua ignorância, que eu em minha consciência. Começaram melhor, que prossigam assim.

À tarde, sigo para o MAM, e pego um ônibus destes com entrada para cadeirantes.
Irritada. Outro ponto que me derruba. Irrito-me com tremenda facilidade. O ônibus faz um PIN ininterrupto enquanto o cadeirante e seu acompanhante sobem. Espio o porque da demora, estou em cima da hora. Pronto. Há de fato muitas pessoas muito melhores que eu. Um menino, 5 anos no máximo, estava na cadeira. Aparentemente uma criança que teve problemas de oxigenação no cérebro. E Seu Pai. Letras Maiúsculas para Ele. Se há bicho homem que mereça perdão, este Senhor é um deles.
Terno, Carinhoso, Calmo. Sozinho. Cuidando do filho doente com mais paciência que eu cuido do meus filhos lindos e sãos. Tudo sob controle, até o menino, que em sua limitaçao traz um ar de felicidade. Meus filhos sempre reinvindicando, agitados, insatisfeitos. Este Pai é melhor que minha porção Mãe, mais eficaz em meio a maiores dificuldades.

Assim, consciente de minha comprovada inferioridade, deparo-me com felizes casais gays no MAM. Magrinhos e leves, femininos, cabelinhos lisos. Abraçam-se tão efusivamente. Ou as moças parrudas, em bermudas largas e tatuagens, em pares, caminhando e aproveitando sem neuras o domingo.

Todos assumiram-se, sabem quem são. Não temem o julgamento da sociedade.

Pobre de mim.
Se assumir tudo que sinto, serei, além de queimada na fogueira acesa, exilada pelo bom senso. Meus sentimentos precisam esconder-se.
Apavoro-me. Há muitas pessoas no mundo melhores que eu.

O beijo do Anjo

Rua
Noite
Asfalto
Ar
Ar Livre

Um anjo que vem à noite


Passei um dia estranho
Dividida entre medos e certezas.

Um dia de falas
e de escutas - todas públicas, por favor.

Adormeci com dor
Na verdade, não adormeci.
Entorpeci de dor.

Acordei na rua,
sob o beijo doce
de anjo gigante
com asas poderosas
gigantes como ele.

Esse beijo deste anjo
Serve perfeitamente
para minha boca e meus sonhos gigantes

E em meu ouvido disse
Que a verdade e seus incomôdos
Vão se revelar e se acomodar,
a dor, a terrível dor vai passar.

Acredito.
Acredito nos seres que tem asas,
São livres,
Mais livres que nós.

Renato Russo já dizia
que só a verdade liberta.
Monteiro Lobato profecia que nós mesmos
compomos a história da verdade,
e se for bem contada, o povo acredita.

Os dois também foram anjos,
livres em sua sabedoria.
A liberdade é a marca da verdade,
Não há vôos na mentira.

O dia de hoje será mais feliz que o de ontem,
como são os dias
em que acreditamos nos anjos
Nos pássaros,
e nos sonhos sonhados
e nos seres alados de Martinho,
o anjo da Vila.
Lembro-me do padre bom que dizia
que há anjos por todo o lado.

Encontrei o meu,
Ou ele me encontrou.
Não sei - sei que me beijou,
e voou.
e enquanto espero seu retorno
encho os olhos e os sonhos,
sou mais um dos que esperam
e sonham
com a libertação pela asas da verdade.
A verdade voa.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Os Sobreviventes da Sala 5

Rio, Mar, Lagoa
Pedra, Areia, Morro
Passagens

Em 8 de Abril, dia seguinte ao ataque a Escola de Realengo


Para os alunos da sala 5


Sobrevivem os bonequinhos japoneses,

Os soldadinhos sírios,
os meninos judeus,
os aladins libaneses.

Não resistiu a princesa Nardoni,
Nem a asfixiada Ruth,
nem a convulsiva Joana.
Diego se foi com seu violino.

Sobrevivem alguns alunos da sala 5
Às mortes às tragédias aos dramas
As almas sobrevivem, algumas,
náo todas.

Quem as escolhe,
nào sei.
para onde correm,
nào sabem,
em sua inocente vida não sabem ainda para onde vão,
da onde virá o fôlego para a fuga,
e com desespero atônito recusam-se a entregar-se.


Sei que para estes pequeninos,
A menor brecha é a saída,
Encontrem, corram, escorreguem mas levantem.
Salvem-se por mais um segundo apenas,
Protejam seus corpos adolescentes.
Suas mentes.
Até que chegue o socorro,
a polícia, o silêncio,
Fiquem vivos até que parem os tiros.

Meninos,
Recusem-se a morrer.

Vocês são os que continuarão nossa raça,
sob uma chuva ácida de balas, águas, mares,
vencendo ameaças nucleares

Vencerão os loucos, os cruéis,
os monstros.
As ordens de guerra,
Os pedófilos, os psicopatas.
Terão que vencer seus próprios pares.
Preparem-se.

Sinto-me inútil no conforto da minha casa,
Culpada por tanta segurança,
Queria poder mais que palavras,
Mais que fraca esperança.
Pensei na rosa de Hiroshima e suas rotas alteradas
As meninas cegas, mortas,
para sempre castigadas.

Quero outro mundo,
com um querer que se sabe fragilíssimo.
Povoado por outros humanos mais humanos,
E vidas humanas mais possíveis
Possivelmente livres.

Criando crianças que náo precisem fugir.
Que possam gostar, possam crescer
Possam deixar-se ficar
Despojadamente deixar-se ficar.

A raça humana precisa
eu preciso
precisamos todos
poder parar de precisar fugir

E ainda que não saibamos como
E que sigamos nos destruindo com abandonos,
Com delatores anônimos,
Com mentiras, e ameaças,
Enganos,
Poupemos os alunos da Sala Cinco
e todas as outras crianças.

A Acusação

Limbo
Vácuo
Solidão
Rio de Janeiro
Território Deserto do meu coração



Veio a inquisição,
Esconda-se bruxa,
vieram os fatos
Reais e deturpados.

Revelam-se confissões
Gemidos, delírios.
Sonhos acorrentados.

A bruxa enfim queimará na fogueira
Pagará pelos seus feitiços
Pelas suas gargalhadas

Pagará pelos pecados
Pelos beijos roubados.
Pelas noites de música e de luar.
A bruxa por tudo e por todos pagará.

Da onde veio o inquisitor?
Estava disfarçado.
Covardemente invisível,
Veio de perto, de longe,
Veio não se sabe como,
Mas veio, dedo em riste.

Confessemos: a bruxa pediu.
Era mesmo irresponsável.
Sentia-se livre, mas não era,
andava solta, quando devia ocultar-se.
Esqueceu da época em que vivia,
E que de cega, só havia sua vítima.
Esquecia dos delatores,
Espiando, tramando.
Apontando.

Seu destino era, portanto, previsível.

Mão pesada do castigo carregado da dor fermentada
Porque o oculto, mesmo suposto, fermenta
Cultiva
Alimenta
O pretenso silêncio protege
E com proteção, ainda que pretensa, o segredo cresce.

O inquisitor venceu e somos todos culpados.
Nesta fogueira ardem os três.
O cúmplice, a bruxa, e a cega vítima.
Os três estão condenados.
Foram acusados e julgados.
Onde havia comemorações,
há solidão,
onde havia abraços,
há vazios espaços.

E por onde a bruxa entre risadas voava.
ficou um buraco, um poço vazio, um vácuo.
Ela caiu, céu abaixo.

Parabéns, inquisitor,
parabéns seu covarde.
Dentro de sua capa negra estás vitorioso.
Sei que és um dos me lêem, escrevo para ti.
Quero que saibas que sou sim a bruxa,
mas que não sou surda nem cega,
Eu te descobrirei enquanto ardo.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Não estamos acostumados

Rio de Janeiro

Ipanema
De novo
Sempre
Se Deus quiser

Vamos abrir o presente

A notícia ruim chega logo, já dizia minha vó.
E acrescento, tem mais credibilidade.
Todo mundo acredita em tragédia. É provável, é esperado, é perfeitamente possível.
Além do mais, ver o sofrimento do outro diminui o nosso próprio. A comparação entre as dores cria uma rede, sádica, de amparo entre os iguais.

Experimente trazer uma boa notícia. Veja se alguém se empolga. Desconfiam. Torcem o nariz. Questionam a verdade por trás dos fatos.
Seu marido, por exemplo. Se chegar com flores, vai pensar que aprontou alguma.
Promovido, como?, deve ter seus conchavos.
Precisamos macular o outro, seus feitos. Minimizar seu esforço, vulgarizar seus sentimentos. Precisamos reduzir seus méritos, que feio.

É isso - cultivamos a sensaçao de que tudo é muito pouco, é ruim, é insatisfatório.
Porque? Porque achamos que somos superiores. Náo nos enganaráo facilmente. Da mesma forma, em mão dupla, é difícil nos encantar.

Precisamos, com urgência, perceber que há qualidade no mundo e nas pessoas que nos cercam.

Precisamos acreditar.
Confiar.
Apoiar.
Garantir.

Mas de uma forma geral e cruel, não é fácil. Não nos deixamos convecer pelo outro. Precisará provar, incessantemente, suas virtudes.

Tenho um exemplo. Chega uma carta e diz que seu namorado tem outra. Você jamais confiará nele novamente. Mas se tocar o interfone e o porteiro que você conhece há vinte anos disser que está subindo um moço da joalheria, de crachá e tudo, está arriscado que chame a polícia, apavorada.

A vida nos dá dores sim, amiúde, infelizmente.
Mas os presentes que envia, ignoramos muitas vezes.
Desconfiamos. Suspeitamos.

Somos gente. Tememos o bicho homem. Tememos o próximo, Aprendemos, nas cavernas e nas alcovas, que os medos nos protegem. A prudência tem a função de proteção, e a temos por um escudo invulnerável. Mentira. Não minimizará, em nada, nossas decepções.

Por isso, tenho tido uma vontade imensa imensa de ter mais coragem e acreditar mais.
Ser menos prudente.

Desafiar o perigo e fechar os olhos; atirar-me. Abrir os presentes que chegam pelo destino, sem temer que escondam uma bomba.

Bater palmas ante o embrulho ainda fechado.

Que venham para mim, abrirei a caixa sem medo.

Para alforriar-me de tanto bom senso, de tanta precaução.

Estou presa a ditadura do cuidado, e isto, de fato, é claustrofóbico.

Quero as boas novas e os maravilhosos prêmios da vida vivida com alegria.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Me salve, Musical

Casa de Laura,
Ipanema
Vieira Souto
Horizonte do mundo



Susana Ribeiro, Gustavo Gasparani, Fernando Alves Pinto, Isabel Cavalcanti, Celso Andre, Keli Freitas,

Querem ver uma atriz maravilhosa? Fácil.
Assistam esse musical. Conheçam a Alma Duran, atriz, nome dramático para a dramática personagem de Suzana Ribeiro. São, portanto, duas estrelas.
Confirmem as possibilidades, imensas, amplas, convidativas do talento.
Susana Ribeiro e Gustavo Gaspariani

Interpreta outra atriz, viciada em sua personagem de maior sucesso. Faz rir, muito. Choca o público com seu mau humor, ironias, amarguras.
Chique em seu desdém, desdenha o que não lhe elogia. É um pouco louca, e eu adoro. Entra como dondoca, madame. Um ar de anos dourados e passados. Nada disso, é mais contemporânea do que pode parecer.
Traída pelo marido, o trai. Paga na mesma moeda. Ri de tudo, gasta horrores no cartão de crédito, tem álibi para a vingança. Atraca-se com a amante dele, depois quer beijá-la.
Conclui que ama ao marido e ao amante, seu psicanalista.
Cantando, dançando, e sem titubear em seu vestido impecável e saltinho cor de rubi.
Quando você pensa que está se identificando com sua Alma, ela apronta outra, e outra, e outra. Impossível de emparelhar.
Posso, e devo ser justa, elogiando os demais - Celso André, por exemplo, imenso e feminino, retrata o homossexual bem sucedido, que de repente perde a pose e deixa cair numa rumba. Hilário. Mas reservo meu aplauso especial, de pé, para Suzana Ribeiro. À vontade no romance, solta na comédia, elegante no musical; desesperada de cafonice da tragédia. Será uma grande dama do teatro, ou arrisco, já é.

A peça é uma grande brincadeira, uma salada mista. Uma viagem impossível, em um avião que não aterrissa, e portanto, jamais decolará. Pergunto-me se existe. Os pretensos passageiros confinados no saguão do aeroporto encontram-se a beira de um ataque de nervos. Ameaçados pelo passado e pelo presente, são aatacados por um vírus fantasioso. Discussões e cobranças, devaneios existencialistas, amores vãos; no fim muita confusão e finais felizes. Tudo perdoado, nada resolvido, vamos dançar e cantar mais.

Melhor seria em dois atos, com elogios ao primeiro, um intervalo (devia ser lei: a peça tem duas horas? Intervalo. As pessoas, gente, querem ir ao toilette), e restrições ao segundo. Até para mim, naturalmente doida, achei doido demais.

Mas não quero criticar não. Alegrou meu domingo de chuva, como o dos demais. E tive a grande oportunidade de reconhecer, sob protesto: o elenco foi mais importante que o roteiro.
Não há resultado de sucesso sem o sucesso das pessoas.
O elenco é show, salvou o Musical sim. Estou encantada - show mesmo, e sucesso, é a Suzana Ribeiro.

Suzana, em sua Dalva, participação especial na novela Insensato Coração.

Palmas para a estrela

domingo, 3 de abril de 2011

Espelho

Rio de Janeiro

Sem Pecado

Espelho
para espalhar
O olhar



Espelho

Abraço

Afago

Pedaços

Inteiros

Fotografados

pelo beijo

Reflexos

Desdobramentos

do sexo

e do sentimento.

Repetem-se

e copiam

a pele

o cabelo

os pêlos

Tudo

espalha-se

pelo espelho

Tudo

é invertido

e é representado

exatamente ao oposto

sem estar errado

Tudo

divinamente enquadrado

exposto

corpo composto

extasiado.

Dispensa-se a palavra

diante do fato.

A imagem é livre

amplo labirinto

para enfeitar

nosso retrato

assim surpreendido

pelo espelho do quarto

sábado, 2 de abril de 2011

Simonal , ninguém sabe o duro que eu dei, Parte II

Oi, Ipanema
Voltei,
e vale a pena
Tudo vale, se é em Ipanema


Simonal, no apoteótico show do Festival

Senhores, viva o Oi Futuro de Ipanema.

Viva o atraso de 40 minutos, que quase expulsou os poucos presentes, mas que nos deu mais 40 minutos ali, no coração da Ipanema da minha infância.
Ali tudo é melhor. Com chuva e com atraso também.

Enfim, eu estava lá. Fui assistir mais Simonal, agora em debate. Adoro debater, discutir, discordar. Quero um pouco de discórdia, traz movimento ao pensamento.

Miele estava lá. O diretor Michael Langer estava lá. Tarik de Souza, um monstro de conhecimento musical, Marcelo Junot, crítico de cinema. Ouvi Miele dizer a produtora: vamos esperar se chega mais alguém. Não chegou. Boicataram de novo o meu Simonal. A ausência de público é a pior vaia para o artista. Sou mais fiel que gostaria. Fiquei para aplaudir.

Desconfio. Porque não houve nenhuma divulgação? Porque não anunciaram as presenças ilustres? Lotaria, claro, ainda mais a entrada era franca. Faltaram a pompa e circunstância de praxe para dar mais dignidade e quórum à memória do meu Simona. Tenho a honra de tê-lo assistido pela quinta vez e embarcado na mesma viagem. A platéia sobe ao auge da alegria, da fama, do sucesso, e desce com ele até o fim triste de sua vida. Ficamos sentados, sem saber o que fazer por Simonal e pelo debate. Miele diz que vai tomar um drink.
A produtora diz não, fique. Pelos presentes. Sobe a tela, surgem quatro cadeirinhas no palco.

Alívio. Os presentes relaxam. Teremos o privilégio de um debate particular, com feras, de alta qualidade.

Iniciam comentários sobre o aspecto cinematográfico. Penso que perdi a viagem. Quero saber da vida do Simona, caramba. Salva por Miele, que em sua irreverência elegante assume a liderança da situaçao e pergunta ao Tarik, um baú musical, quem foi Simona para a música brasileira. Aí sim entendo porque fiquei. A onda de carinho e admiração espalha-se pelo ambiente, pequeno, e muito chique. Éramos todos fãs e não entendíamos como um talento pode se enterrar deste jeito. O diretor, tenho a honra de dizer, concordou comigo: ele se enterrou.
Tentou reerguer-se por um breve momento mas náo conseguiu mais.

Miele apresenta deliciosas fofocas da ocasião: o show que produziu entre Simona e Sarah Vaughan foi marcado pela inicial arrogância dela, que teimou em não recebê-lo por três dias seguidos, para acertarem detalhes do texto. Trouxe seus músicos e queria se fazer acompanhar por eles. No ensaio foi surpreendida pela mãalícia brasileira: Miele combinou com o Som 3 arranjos impossíveis de serem executados por quem não fosse da banda. Vitória maior: Sarah entendeu o recado e amansou-se. Disse que nunca tinha feito nada igual e virou figurinha fácil no Brasil. Langer pergunta se Simonal ficou com a grande dama, não, claro que não, com aquela peruca estava igual à mãe do ídolo. Risos, vários.

Muitas questões traduzindo a revolta para com os artistas que fecharam as portas ao maior talento que já houve por aqui. Não souberam perdoar. Miele afirma sucessivamente, que tentou reunir as boas simpatias. Boni tentou. Oitenta e quatro artistas de peso assinaram uma lista pedindo para sair da Globo se o Simonal aparecesse por lá. Desculpe, senhor, meu amor não acredita que ninguém enfrentasse o Boni desta forma, e meu amor sabe o que diz.

De tudo, fiquei impressionada com a sabedoria do jovem diretor, que assume seus 36 anos, poucos para o tamanho de sua ampla competência. Disse que a natureza humana é assim: quer criticar, apontar, julgar. Quer rotular, perseguir, crucificar - fizemos com outros também, que nào se permitiram derrubar. Dois: que nào há, no Brasil, outro material tão fascinante para um documentário. Três, e mais que tudo: essa história não tem final feliz para ninguëm. Simonal perdeu tudo, o contador ficou com fama de ladrão pela vida toda, nunca mais se empregou em lugar nenhum, vive na pobreza. E nós perdemos o maior cantor que já tivemos.

Miele indaga a Tarik quem é seu herdeiro musical. Arrisca Emilio, o Santiago, com hesistaçao, é o único que teria a mesma competência. Miele discorda.
Meu amor me explica que é pelo timbre, pelo suingue, por ser também negro. Mas Emilio, concordemos, não seduz as massas, predominantemente femininas. Nem quer isso. Falta o furor que Simonal causava.

Falta gente nesta platéia, e falta Simonal no Brasil.
Aplausos, poucos e sinceros.
Miele, produtor que é, indica: vamos todos para casa ouvir "se você quer ser minha namorada" e "minha" na negra voz do enterteiner.
Aceitem o convite, não como póstuma homenagem. É mais que isso. É divino.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

As sogras da nossa vida

Rio de Janeiro,
República do amor e seus efeitos colaterais


As sogras estáo soltas por aí

Sei perfeitamente que sexta feira não é dia de problemas, nem de reclamações,
aliás, nenhum dia deveria ser.
Mas problema de amiga minha é meu problema, e vou falar sim.
O problema tem nome: sogra. Sinônimo: bruxa.

E esta, esta é ruim, mesmo, e de carteirinha.
Cresceu no papel. Acreditou em sua força cênica. Está poderosa em seu drama.

Sou chegada a defender as amigas, confesso, chego a perder um pouco o senso de justiça quando entram no circuito, mas no caso estou justíssima: minha amiga não merecia esta senhora em sua vida. Sou chegada também a defender as senhoras. Depois de anos trabalhando e educando, e lutando, tem seus direitos adquiridos. Podem cometer pequenos deslizes. E vamos confessar, há noras e noras.

Mas nesse caso náo. Estou falando de uma graça de moça. Charmosa, alegre, independente, uma bonequinha de nariz arrebitado. Ao seu lado, a sogra fica ainda mais gorda, mais pesada e parece estar sempre mal humorada. Sente inveja, os fatos são esses sim. A nora é bela, jovem, e dorme com o homem que a bruxa ama. Sua sogra é a eterna mãe do bicho homem, seu filho é o macho da espécie. Não no aspecto sexual, está acima disto. É seu. Fez, alimentou, cresceu. É sua cria valiosa para a natureza, sua doação prestimosa para o futuro da humanidade.

E esta sogra tem seus caprichos. Começou bem, gentil, boazinha de todo. Recebeu de braços abertos a namoradinha do filho. Ensinou-a a fazer docinhos, que jeito você tem para doceira. Sorrisos, mimos. Agrados. Norinha para cá, norinha para lá. O namoro começa a ficar sério. A sogra começa a apavorar-se. O filho volta a estudar, incentivado pela vontade de crescer, ser melhor. Mais sério no trabalho. Junta dinheiro. Pronto. Nada mais de docinhos divididos, não, a sogra quer os méritos todos para si. A prerrogativa da função é dela. A coisa piora. A moça arruma bom emprego. Começa a trabalhar, inteligente que é, é promovida. Vai morar com o rapaz. É ótima companheira para o sortudo. Acabou-se de vez o que era doce.

Incorporou a bruxa. Rejeita presentes. Rejeita consideração. Reclama do tempo, de tudo. Quer ser vítima. Quer ser infeliz. Quer ser abandonada. Quer chantagear. Choros inexplicados. Olhares perdidos, cenas. Tem problemas de saúde, problemas financeiros, tem tudo, só não tem cansaço nesta disputa pelo macho do terreiro. Constantemente inconveniente. Bate na janela do casal altas horas para recados urgentes que de urgentes nada tem - a urgência é dizer que está ali, na espreita. Apresenta o pior lado de seu ser: egoísta. Quer o filho de novo pequeno, para si, sob seu jugo. Quer a vida familiar sob seu comando. Quer a nora inofensiva de volta, essa mulher interessante ela dispensa. Prefere a bonequinha ingênua, a quem manipulava, náo essa competente dona de sua vida.
Pobre dela, quer o que não mais terá. Seu filho cresceu e faz suas próprias escolhas.
Já chorei o que chora minha amiga. Experimentei três sogras oficiais, digamos assim: uma argentina e duas brasileiras. A nacionalidade não as diferencia.
Enlouqueceram-me. Tinham em si fonte inesgotável de conhecimentos vários. Superiores em organização doméstica, em compreensão dos fatos cotidianos e espirituais. Econômicas. Bem dispostas. Sete da manhã roupa passada e almoço pronto. Exemplares como mães e esposas. Arrumadas. Insuportáveis.
Prefiro pessoas menos virtuosas, de forma que eu me identifique mais.
Afirmo com consciência tranquila que esforcei-me. Calei-me. Acatei. Presenteei. Ouvi, engoli. Conversei. Nada. Nada agradava a essas senhoras.

Porém, transformações mágicas ocorriam quando o casamento acabava. Quando meu status de nora era rebaixado (ou promovido) para ex-nora. Que maravilha. Aí então fui defendida. Dores compartilhadas, testemunhos a meu favor. Moça boa, meu filho não sabe o que está perdendo. Falas inversas às anteriores. Sabem o que é? Eu não era mais concorrente.

É isso que não quero nesta vida. Concorrer. Quero ser quem sou e ser amada como sou. Sem stress. Por filho, namorado, amigos. Não quero disputar ninguém. Lutar desesperadamente para mostrar meu valor, para ser mais amada, ou amar mais. Deus me livre.

Isso até cansa.

Não quero impor o amor a meus filhos; está aí. Peguem-no, é seu, não sei se é o mais importante, ou o maior, ou o melhor para você, mas é o melhor e o maior que posso dar-lhes.

O amor não ocupa espaço. Podemos amar marido e filhos, enteados, pais, mães, sogras e sogros, irmãos, cunhados. Noras, genros. Até aos amantes, não é mesmo? Podemos. Se quisermos. Podemos amar mais de longe um pouquinho, protegendo com a distância pequenas diferenças. Ou mais de perto, se os bons ventos permitirem. Sem maluquices. Desligar a fervura dos caldeirões de mágoas. Sem conspirar. Sem tramar. Sem espionar. Sem gorjetas para as empregadas abrirem o bico. Sem arrancar segredos de crianças, de porteiros, vizinhos.

Leves, podemos ser leves.

Minha amiga vencerá. Já venceu. É fada, as fadas suspiram, mas tem seu final vitorioso. Deixam, espertamente, que a bruxa se canse, que sua vassoura quebre, e que suas poções azedem. Um dia a bruxa derrete, e seu amor segue, esvoaçando por aí, ainda mais feliz.


Nota: Peço desculpas às boas sogras, boas avós, mães queridas de homens grandes. Continuem a colaborar com seu carinho, e a contribuirem com sua presença para o bem estar da família. E desculpo o destino, que não botou nenhuma destas em meu caminho.